RMP – Nº 174 | Edição Papel

9.00 18.00 

Ano 44 – 2023*
Abril | Junho 2023
Propriedade e Edição: Sindicato dos Magistrados do Ministério Público

REF: n.d. Categoria:

Informação adicional

Revista Formato Papel

Não Sócio, Sócio

Resumos

As novidades da “agenda do trabalho digno” quanto à duração do período experimental: contradições valorativas?

João Leal Amado
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

A chamada “agenda do trabalho digno”, aprovada pela Lei n.o 13/2023, de 3 de Abril, veio introduzir alterações de relevo no regime jurídico do período experimental, a vários níveis. Uma das matérias que foi objecto de alterações prende-se com a duração do período experimental, seja para trabalhadores à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração, seja para trabalhadores que, antes, tenham frequentado um estágio profissional (n.o 5 e n.o 6 do artigo 112.o do Código do Trabalho). As novas disposições legais suscitam, contudo, forte perplexidade e consideráveis dificuldades, no plano interpretativo, por parecerem representar autênticas contradições valorativas. No limite, a constitucionalidade das alterações introduzidas, ao menos em um dos casos, é muito duvidosa.


Ações judiciais de perda de mandato local e de dissolução de órgão autárquico: entre a defesa da legalidade e a autonomia constitucional do poder local

Jorge Alves Correia
Professor da Faculdade de Direito de Coimbra

O estudo tem por objecto o tema das acções judiciais para declaração de perda de mandato local e de dissolução de órgão autárquico, em face da manifesta actualidade e relevância – política, administrativa e social – desta matéria na vida das instituições democráticas das autarquias locais. A autonomia de dois regimes de cessação do mandato de natureza sancionatória está na base do desenvolvimento de um específico controlo judicial sobre as acções e omissões ilegais dos eleitos locais: um contencioso de natureza urgente, de labor jurisprudencial, imbuído de forte densidade problemática e que vem ocupando um lugar central no espaço mediático, fruto do impacto político e social que lhe está associado. Em sede de avaliação de resultados, a aplicação das regras deste contencioso deve dar resposta satisfatória a uma tensão dialéctica que nele se estabelece e que parece estar, hoje, mais viva do que nunca: permitir a defesa da legalidade democrática e impedir o esmagamento da autonomia constitucional do poder local.


De alguns fundamentos das Constituições cidadãs

Paulo Ferreira da Cunha
Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça

O Direito Constitucional compreende o concreto paralelogramo de forças jurídico-político em presença numa sociedade, e o seu estudo, teorização e ensino. Este artigo tem presente a actual pluralização hermenêutica e prática.

Se, por um lado, há quem invoque o “sagrado nome da Constituição” a propósito de tudo, e sempre veja “novos direitos” ou violações a esses e aos velhos, sublinhando o político, outros professam uma assepsia da análise, procurando depurar a matéria até do seu lastro de sabedoria histórico.

Pode-se ficar com a errónea ideia de que o Direito Constitucional seria ou uma espécie de “política invocadora da lei”, ou um “Direito Administrativo burocrático” (depurado da sua grandeza) dos órgãos de soberania, nessa veste, e pouco mais.

A opção que se perfilha é a de que o Direito Constitucional, sobretudo o das nossas “constituições cidadãs”, é inseparável da sua memória e legado histórico, e assenta em valores e princípios. De entre os Fundamentos desse Direito Constitucional de parte inteira, e não meramente politizado, ou liofilizado e descaracterizado, destaca-se a importância da Constituição material, em diálogo com a formal e a real, dos Poderes Constituintes, originário e derivados, e da Democracia ética, inspirada pela ética republicana, de valores e virtudes constitucionais.


A progressiva relevância dos direitos fundamentais na administração dos fundos europeus

Ricardo Pedro
Doutor em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa
Investigador no Centro de Investigação de Direito Público (CIDP) da Faculdade de Direito de Lisboa

O artigo trata da progressiva relevância que os direitos fundamentais previstos na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia (Carta) vêm assumindo na administração dos fundos europeus. Para este efeito, são analisados os regimes jurídicos europeus dos fundos europeus, com destaque para os recentes Regulamentos de Disposições Comuns, e são explorados os aspectos mais relevantes do cumprimento da Carta no contexto da adminis- tração dos fundos europeus para os períodos de financiamento 2014-2020 e 2021-2027, incluindo o regime jurídico nacional previsto para o cumprimento da Carta para o período de financiamento de 2021 a 2027.


Proposta de criação de novo regime das infracções antieconómicas e contra a saúde pública

Paulo Pinto de Albuquerque
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa

Rui Cardoso
Procurador da República

O direito penal económico e da saúde pública está ainda hoje fundamentalmente estabelecido no Decreto-Lei n.o 28/84. Este diploma encontra-se manifestamente desactualizado, remetendo para normativos legais já revogados (artigo 12.o, n.o 3, ou artigo 47.o, n.o 1, por exemplo) ou para figuras jurídicas hoje inexistentes [artigo 6.o, alínea e)], ou até para uma moeda já sem valor legal (artigo 7.o, n.o 4, ou 10.o, n.o 1, por exemplo). Mais grave ainda, vários dos seus institutos (v. g., responsabilidade criminal das pessoas colectivas e equiparadas e as penas que lhes são aplicadas; penas cumulativas de prisão e multa) carecem de profunda revisão, em virtude da notória incoerência entre estes artigos e o regime estabelecido no Código Penal.

Em face deste cenário, o que os Autores propõem é uma reforma global do Decreto-Lei n.o 28/84, há muito reclamada pela prática judiciária e pela doutrina. Simultaneamente, revêem-se algumas incriminações do Código Penal, cujo bem jurídico essencial se deve incluir entre os previstos num diploma que regula especificamente o direito penal da economia e da saúde pública, deixando assim de ter lugar nesse Código. É apresentado um projecto integral de articulado.


Do dever de prestar informação, com qualidade, no prospecto de aumento de capital.
A responsabilização contra-ordenacional do administrador por violação da norma de dever

Mariana Gomes Machado
Juíza de Direito
Mestre em Direito e Segurança

A qualidade da informação vem merecendo crescente atenção do legislador, que, para tanto, em regimes sectoriais, como sejam o Regime Geral de Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras ou Código de Valores Mobiliários, curou de especificar em que consiste o conceito de informação de qualidade, de um lado, e que normas de dever recaem sobre quem tem o dever legal de assegurar a disponibilização de informação de qualidade, por outro lado.

Na economia do artigo, a Autora circunscreve-se à problemática do dever que recai sobre o administrador de prestar informação com qualidade no prospecto de aumento de capital, regulado pelo Código de Valores Mobiliários, e a correspondente responsabilização contra-ordenacional em caso de violação da norma.

Neste iter, aborda as seguintes questões: i) o dever de prestar informação, com qualidade, no prospecto de aumento de capital: norma de dever, sua axiologia e alcance; ii) o agente titular do dever de informação: o conceito de autor, na dogmática do ilícito contra-ordenacional; iii) a conformidade constitucional da norma de dever.


As palavras que nunca te diria – diários íntimos e prova em processo penal

António Brito Neves
Professor Auxiliar convidado da FDUL
Investigador do IDPCC

Comenta-se a decisão judicial de um caso em que se ponderou a utilização de um diário íntimo como prova de um crime. Desenvolvem-se os termos em que a questão deve ser pensada no Ordenamento português, e a solução que ela merece.


O Ministério Público no século XIX e António Cândido, o último Procurador-Geral da Coroa e Fazenda (1898-1910)

Luís Eloy Azevedo
Procurador-Geral Adjunto

O texto está inserido no âmbito da Evocação do Conselheiro António Cândido (1850-1922) por ocasião do centenário da sua morte e visa perscrutar uma das facetas menos conhecidas da sua vida: a ligação ao serviço público de justiça através da Procuradoria-Geral da Coroa e da Fazenda.

Está dividido em três partes: na primeira, dá-se um quadro muito sucinto e uma imagem da natureza e do contorno do Ministério Público no século XIX; na segunda, traça-se dois tipos de perfis marcantes da sua liderança nesse período nas pessoas de Aguiar Ottolini (1798-1859) e de Martens Ferrão (1824-1895); e na terceira, aborda-se especificamente a dedicação de António Cândido à tarefa do Ministério Público, como Ajudante do Procurador-Geral da Coroa e como Procurador-Geral da Coroa e Fazenda (1898-1910).

Abstracts

The novelties of the “decent work agenda” regarding the duration of the trial period: value contradictions?

João Leal Amado
Full Professor at the Faculty of Law of the University of Coimbra

The so-called“decent work agenda”, approved by Law No. 13/2023, of April 3, introduced important changes in the legal regime of the trial period, at various levels. One of the areas that was subject to changes concerns the duration of the trial period, for workers looking for first-time employment and the longterm unemployed, and for workers who previously completed a professional internship (Articles 112 (5) and (6) of the Labour Code). The new legal provisions raise, however, strong doubts and considerable difficulties, in terms of interpretation, as they seem to represent authentic contradictions in values. Ultimately, the constitutionality of the introduced amendments, at least in one of the cases, is very doubtful.


Actions for loss of local mandate and dissolution of a local authority: between the defense of legality and the constitutional autonomy of Local Government

Jorge Alves Correia
Professor at the Faculty of Law of CoimbraPublic Prosecutor

The study deals with the issue of actions for declarations of loss of a local mandate and dissolution of a local authority, in view of the clear timeliness and relevance – political, administrative and social – of this matter in the life of local authority democratic institutions. The sanctioning nature of the autonomy of two mandate termination regimes is the basis for the development of a specific judicial control mechanism over the illegal actions and omissions of local elected officials: litigation of an urgent nature, of jurisprudential work, imbued with a strong problematic density and which has been the centre of media attention, as a result of the political and social impact associated therewith. In evaluating results, the application of the rules of litigation must respond satisfactorily to a dialectical tension that is established therein and that seems to be more alive today than ever before: to allow for the defense of democratic legality and prevent the crushing of the constitutional autonomy of the local government.


Some foundations of citizen Constitutions

Paulo Ferreira da Cunha
Judge at the Supreme Court of Justice

Constitutional Law comprises the concrete parallelogram of legal-political forces present in a society, and its study, theorization and teaching. This article bears in mind the current hermeneutical and practical pluralization.

If, on the one hand, there are those who invoke the “sacred name of the Constitution” for everything, and always see “new rights” or violations of these and old rights, highlighting politics, others profess an aseptic analysis, seeking to purify the matter even from its ballast of historical wisdom.

One might have the erroneous idea that Constitutional Law would be either a kind of “politics invoking the law”, or a “ bureaucratic Administrative Law” (purified of its grandeur) of the organs of sovereignty, in that guise, and little else.

The option adopted is that Constitutional Law, especially that of our “citizen constitutions”, is inseparable from its past and historical legacy, and is based on values and principles. Among the Fundamentals of this Constitutional Law, which is integral and not merely politicized, or lyophilized and mischaracterized, the importance of the material Constitution stands out, in dialogue with the formal and real constitutions, of the Constituent Powers, original and derivative, and of Democracy ethics, inspired by republican ethics, comprised of constitutional values and virtues.


The progressive relevance of fundamental rights in the administration of European funds

Ricardo Pedro
Doctor in Law from the Faculty of Law of the Nova University of Lisbon.
Researcher at the Centre for Public Law Research (CIDP) of the Faculty of Law of Lisbon

The article deals with the progressive relevance that the fundamental rights provided for in the Charter of Fundamental Rights of the European Union (Charter) have assumed in the administration of European funds. To this end, the European legal regimes for European funds are analysed, with a focus on the recent Common Provisions Regulations and the most relevant aspects of the compliance of the Charter are explored in the context of the administration of European funds for the 2014-2020 and 2021-2027 funding periods, including the national legal regime foreseen for Charter compliance for the 2021-2027 funding period.


Proposal for the creation of a new system for anti-economic and public health offences

Paulo Pinto de Albuquerque
Full Professor at the Faculty of Law of the Portuguese Catholic University Rui Cardoso
Public Prosecutor

Criminal economic and public health law is still fundamentally established in Decree-Law No. 28/84. This law is clearly outdated, referring to legal regulations that have already been repealed (Article 12 (3) or Article 47 (1), for example) or to legal entities that do not exist today (Article 6 (e)), and even to a currency that already has no legal value (Article 7 (4) or 10 (1), for example). Even more seriously, several of its provisions (e.g., criminal liability of legal and equivalent persons and the penalties imposed on them; cumulative prison sentences and fines) need profound revision, due to the notorious inconsistency between these articles and the regime established in the Penal Code.

In view of this scenario, what the Authors propose is a global reform of Decree-Law No. 28/84, long demanded by judicial practice and doctrine. At the same time, some provisions of the Penal Code are analyzed in light of this exercise, and it is argued that some of them must be included in this law that specifically regulates criminal economic and public health law, thus ceasing to have a place in the Penal Code. A full draft of the new law is proposed.


The duty to provide quality information in a capital increase prospectus.
The administrator’s administrative liability for breach of duty

Mariana Gomes Machado
Judge
Master in Law and Security

Information quality has been receiving increasing attention from the legislator, who, for this purpose, in sectoral regimes, such as the General Regime of Credit Institutions and Financial Companies or the Securities Code, decided to specify what the concept of quality information consists of, on the one hand, and what rules apply to those who have a legal duty to ensure the availability of quality information, on the other hand.

In the context of a brief article, the Author focuses her analysis on the issue of the duty that falls on the administrator to provide quality information in a capital increase prospectus, regulated by the Securities Code, and the corresponding administrative liability in case of a violation of the duty.

In this iter, the following issues are addressed: i) the duty to provide quality information in a capital increase prospectus: duty, its axiology and scope; ii) the agent who has the duty to provide information: the concept of author, in the dogma of illicit administrative offenses; iii) the constitutional conformity of the duty.


The words I would never tell you – personal diaries and evidence in criminal proceedings

António Brito Neves
Invited Assistant Professor at FDUL IDPCC Investigator

A court decision where the use of a personal diary was considered as criminal evidence is discussed. The terms in which the issue should be thought about under the Portuguese legal system are developed, and the solution that it deserves is provided.


The Public Prosecutor’s Office in the 19th Centuryand António Cândido, the last Prosecutor-General of the Crown and Treasury (1898-1910)

Luís Eloy Azevedo
Deputy Prosecutor-General

The text is part of the Evocation of Counselor António Cândido (1850-1922) on the occasion of the centenary of his death and aims to examine one of the lesser-known facets of his life: the connection to public service of justice through the Attorney General’s Office of the Crown and the Treasury.

It is divided into three parts: in part one, there is a very succinct picture and an image of the nature and outline of the Public Prosecutor’s Office in the nineteenth century; in part two, two striking profiles of his leadership in this period are drawn by Aguiar Ottolini (1798-1859) and Martens Ferrão (1824-1895); and in part three, António Cândido’s dedication to the task of the Public Prosecutor’s Office, as Assistant to the Attorney-General of the Crown and as Attorney General of the Crown and Treasury (1898-1910) is covered.

SMMP - LOJA ONLINE