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Ano 39 – 2018*
Julho | Setembro 2018
Propriedade e Edição: Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
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Manuel Atienza
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Alicante
Direito ao silêncio corporal: significado crítico de uma metáfora em processo penal
Jorge dos Reis Bravo
Procurador da República
A problematização do corpo – esse protagonista da pós-modernidade – no quadro jurídico-probatório pode envolver questões que hoje são comuns às interrogações da filosofia, da ética, da antropologia, da sociologia e da ciência em geral e das ciências da vida, em particular. Num cenário contemporâneo, em que se propõe um «adeus ao corpo» ou o abandono de um conceito identitário tradicional de corpo, os moldes da relevância da corporeidade no processo jurídico (ou judicial) podem vir a ser também modificados. Tal ocorre quando se questionam as influências do movimento Queer – ao apontar para um género construído pelo próprio titular, desligado das categorias naturais pré-determinadas (masculino/feminino) –, as consequências de modificações genéticas (edição ou reprogramação do genoma) ou de cirurgias plásticas e de transplantações, bem como de alterações biossintéticas.
Por outro lado, o silêncio como valor contraposto ao ruído – considerado este como excesso de conteúdos de informação ou de atividades no quadro de sociedades contemporâneas complexas – assume, ele também, no âmbito do procedimento penal um significado próprio e distinto, quando em causa possa estar o acesso a elementos de prova corporal, cuja mudança de conceção importa compreender.
Delimitado negativamente o âmbito da produção de prova corporal com a proibição da tortura e outros meios de prova ilícita, o autor tenta perceber a admissibilidade do recurso ao corpo [do imputado] como fonte de prova quando tal se torne necessário ou imprescindível.
No texto, procura-se fazer uma reflexão sobre os quadros da relevância jurídico-probatória do corpo do imputado, face a uma categoria para já inviável – porventura apenas uma metáfora – que se vem designando como direito ao silêncio corporal, mas que crescentemente assume um indiscutível conteúdo substancial.
A falta de condições de procedibilidade para a acção penal e verdadeiras “decisões-surpresa”: interrogações e proposta de iure condendo
André Lamas Leite
Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Porto e da Universidade Europeia (Lisboa)
O presente artigo analisa as hipóteses fácticas em que, em sede de instrução ou de julgamento, por via de uma alteração da qualificação jurídica ou de uma alteração dos factos (substancial ou não), o delito ou delitos em causa, que até aí assumiam natureza pública, passam a configurar-se como semipúblicos ou particulares, não existindo as condições de procedibilidade para a acção penal, o que redunda na absolvição do arguido por falta de um pressuposto processual. Partindo de uma visão material e substancialista deste último, critica-se a solução que, actualmente, é a única conforme ao Direito constituído, propondo-se, assim, uma alteração legislativa que impeça puras decisões de forma em um ramo de Direito que deve estar fundamentalmente interessado em alcançar a verdade (material).
Natureza e equívocos da sançãocontra-ordenacional
Cristina Líbano Monteiro
Professora Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Entendendo o direito de mera ordenação social como uma parte do direito sancionatório – distinguindo-se de modo tão-só quantitativo do direito penal –, julga-se que também a sanção contra-ordenacional se diferencia da sanção penal apenas por ser menos gravosa do que esta. Nessa ordem de ideias, a palavra “coima” – índice formal da natureza contra-ordenacional do ilícito que se destina a punir – deverá assinalar toda e qualquer punição desse mesmo ilícito: pecuniária ou não pecuniária, principal ou acessória ou mesmo de substituição, desligada (de iure condendo) da perda das vantagens decorrentes do facto praticado. Em paralelo com a pena do crime. Participando nas finalidades dela e, como ela, do princípio da culpa.
A representação de Portugal na futura Procuradoria Europeia
e a necessidade de adaptação do Estatuto do Ministério Público
Sandra Alcaide
Procuradora da República
Vinte Estados-Membros alcançaram um acordo político sobre a instituição da Procuradoria Europeia, a quem incumbirá investigar e exercer a ação penal relativamente a crimes contra os interesses financeiros da União Europeia. O Regulamento que institui a Procuradoria Europeia e cria as várias categorias de magistrados que integrarão aquele novo órgão da União Europeia é diretamente aplicável a Portugal enquanto Estado-Membro participante nessa cooperação reforçada. Impõe-se, pois, refletir sobre as escolhas a fazer: quem poderá ser indicado para integrar cada uma dessas categorias, como se fará tal selecção, em que termos tais cargos serão exercidos e, finalmente, e defendendo que devem ser sempre oriundos da magistratura do Ministério Público os nomes a indicar para as várias categorias da Procuradoria Europeia, como compatibilizar a Procuradoria Europeia com o Estatuto do Ministério Público.
Juízes Sociais no Tribunal de Menores: A realidade – 40 anos após a sua criação
Ana Cristina Maximiano
Juiz de Direito
Procurando bem identificar quem são e como funcionam, este artigo visa proporcionar um maior e melhor conhecimento científico sobre a realidade dos Juízes Sociais no Tribunal de Menores. Partindo naturalmente da sua consagração constitucional, é feito o devido enquadramento legal, esclarecendo sobre a sua concepção e operacionalização. Das expectativas criadas e dificuldades vivenciadas – dando mesmo a voz aos próprios através das respostas obtidas a um questionário formulado especificamente para o efeito –; caracterizando a realidade existente, volvidas que estão mais de quatro décadas da existência legal dos Juízes Sociais. Com a institucionalização destes, o legislador terá procurado legitimar a participação popular na administração da Justiça e fazer intervir na decisão do caso concreto a cultura não judiciária e o conhecimento do dinamismo e do tecido social – totalmente despidos da perspectiva técnico-jurídica especializada e própria do juiz de direito – de onde, em particular, provêm as Crianças e Jovens cujo Superior Interesse o tribunal é chamado a salvaguardar. Indo verdadeiramente ao encontro do espírito do legislador – quando este assim o consagrou, também, e em palavras de grande alcance, no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 156/78, de 30 de Junho: a essencialidade de trazer a opinião pública até aos tribunais e levar os tribunais até à opinião pública.
10 ideas about human rights
Manuel Atienza
Full Professor at the Faculty of Law of the University of Alicante
Human rights with their legal and philosophical dimensions are one of the core topics of the philosophy law. Manuel Atienza has been teaching this subject for many years now. In this paper he briefly presents ten ideas about the notion and establishment of human rights, in an attempt to guide initiatives aimed at promoting human rights education, development and protection.
Right to body silence: critical meaning of a metaphor within the criminal proceedings
Jorge dos Reis Bravo
Public Prosecutor
To regard the body as a problem – that post-modern “leading actor” –, within the legal and evidential framework may involve issues that nowadays are common to the questions in philosophy, ethics, anthropology, sociology, as well as in science in general and in life sciences in particular. In a contemporary setting in which it is proposed to “say goodbye to the body” or to abandon a traditional concept of bodily identity, the ways of corporeality being important in the legal (or judicial) procedure may also change. This is the case when one questions the influences of the Queer movement – inasmuch as they show that an individual may develop a gender identity different from the predetermined natural categories (either masculine or feminine) –, the consequences of genetic modifications (genome editing or reprogramming) or of plastic and transplant surgeries, as well as of biosynthetic modifications.
On the other hand, silence as an asset contrary to noise – in this case, the latter is defined as information or activities in excess, in the context of complex contemporary companies – has, itself, a specific and distinctive meaning within the scope of the criminal proceedings, whenever the access to pieces of physical evidence is at stake. It is important to understand the change of the concept of bodily evidence.
As the scope for the presentation of bodily evidence is negatively delimited by the prohibition of torture and other illegal means to obtain evidence, the author tries to grasp the admissibility of the use of the body of the [accused] as a source of evidence, if necessary or fundamental.
The absence of the conditions needed for the criminal proceedings to commence and true “surprise decisions”: doubts and proposal for de iure condendo
André Lamas Leite
Professor at the Faculty of Law of the University of O’Porto as well as of the European University in Lisbon
This paper examines the factual circumstances in which, in the course of the “instrução” or trial stages of a criminal proceedings, the crime or crimes in question that until then were public in nature become semi-public or private due to a change in the applicable nomen iuris or a change in the facts (whether substantial or not). As a consequence, the conditions needed for the criminal proceedings to commence are non-existent which, in turn, leads to the defendant’s acquittal on the basis of a lack of a procedural requirement. The paper criticizes the solution, which currently is the only one admissible de iure condito, from a material and substantive point of view. So, a legislative amendment impeding pure form decisions in a branch of law that must be fundamentally interested in attaining the (material) truth is proposed.
Nature of the administrative penalty and the misunderstandings caused by it
Cristina Líbano Monteiro
Assistant Professor at the Faculty of Law of the University of Coimbra
By considering the law on administrative offences a part of the law on penalties — and as such just quantitatively different from criminal law —, we also deem that the sole difference between administrative and criminal penalty is that the former is less serious than the latter. Along these lines, the word ‘fine’ — a formal indication that the offence it is intended to punish is administrative in nature — shall indicate every punishment for that offence: monetary or non-monetary; principal or accessory or even subsidiary, disconnected from the loss of proceeds of the act that has been committed. It runs parallel to the sentence for the crime. The fine has the same aims as the sentence, and the principle of guilt also applies to it.
The representation of Portugal in the future European Public Prosecutor’s Office and the need to adapt the Statute of the Public Prosecution Service
Sandra Alcaide
Public Prosecutor
Twenty Member States reached a political agreement on the establishment of the European Public Prosecutor’s Office. It shall be responsible for investigating and prosecuting criminal offences affecting the financial interests of the European Union. The Regulation establishing the European Public Prosecutor’s Office and creating several categories of prosecutors who will be an integral part of the new body of the European Union is directly applicable to Portugal as a Member State participating in this enhanced co-operation. It is therefore important to reflect on the choices to be made: who may be appointed to integrate into each one of those categories? How will such a selection be made? How will such functions be exercised? And, finally, while always defending the idea that the candidates to be nominated for the different categories of the European Public Prosecutor’s Office should be public prosecutors, how to make the European Public Prosecutor’s Office compatible with the Statute of the Public Prosecution Service?
Lay judges at the Juvenile Court: the status quo – 40 years after the creation of the office of lay judge
Ana Cristina Maximiano
Judge
In seeking to properly determine who the lay judges are and how they work, this article aims to contribute to a greater and better scientific knowledge about the status quo of lay judges at the Juvenile Court. The legal framework is duly presented, beginning with their constitutional enshrinement and then explaining how the concept emerged and how it is applied. The article deals with the expectations and difficulties encountered. It even gives voice to lay judges through their answers to a questionnaire specifically made for that purpose. It describes the current situation, now that more than four decades have passed since lay judges have legal existence. The lawmaker’s purpose behind the institutionalization of lay judges may have been to try to legalize popular participation in the administration of justice, as well as to let the non-judicial culture and the knowledge of the dynamism and the social context where children and young people – whose best interests the court has to protect – come from take part in the decision on the particular case. Those two features are entirely stripped from the judge’s technical and specialized legal perspective and thus genuinely meet the lawmaker’s spirit – as he enshrined it, also by means of far-reaching words in the preamble to Decree-Law No. 156/78, of 30 June 2006: it is essential to bring public opinion to the courts and bring the courts to the public opinion.